Bandini (1963)

Bimal Roy. Ah, Bimal Roy. Meu amor, meu lindo, meu doce, meu forte, meu querido Bimal Roy. Ainda não conheço gente o suficiente para ter um diretor favorito, mas o Sr. Roy já está na lista. Nunca vi algo dele que eu não gostasse e a ele devo o fato de finalmente ter gostado da história de Devdas, que antes eu achava muito chata. Depois de trazer uma Nutan tão fofa e doce em Sujata (1958), conseguiu repetir o feito em Bandini. Além da Nutella, também estão no elenco Ashok Kumar (grrrrr), Dharmendra (!), Raja Paranjpe e Tarun Bose. 

A história começa com Kalyani (Nutan) no lugar em que eu menos esperava ver uma cena da Nutan: a prisão. O médico Devendra (Dharmendra) precisa que alguma detenta se voluntarie para cuidar de uma delas, uma senhora com tuberculose. A única que tem coragem para tanto é Kalyani, que cuida da senhora com muita paciência a carinho. Vendo a bondade e dedicação da moça, Devendra se apaixona por ela, que não quer que o futuro dela seja manchado pelas ações de seu passado. Quando o diretor da prisão (Tarun Bose) questiona sobre sua vida e o que a levou a cometer o assassinato que a fez ser condenada, somos levados a conhecer as memórias de Kalyani. Flashback!

Cara de "Eu sofro": especialidade de Nutan ou Meena Kumari?

"Oi, meu nome é Dharmendra e
 minha especialidade é SER LINDO"
Este filme é lindo. Comentei no post anterior sobre a importância das mulheres nos filmes do Bimal Roy, e Bandini é todo centrado na Kalyani: sua dor, seus desejos, suas decisões, seu destino. Outra coisa que eu havia comentado é sobre como a Nutan me faz gostar de personagens que eu facilmente odiaria, e isto aconteceu com a Kalyani. Ela fala baixo, baixa a cabeça. Aliás, alguém já reparou que a voz da Nutan parecia um miado de filhotinho de gato? É muito bonitinha! Ofendo ao perguntar se já havia dublagem na época? [/momento vovó] Voltando ao filme, a Kalyani é mais uma das personagens que mostram todo o sofrimento pelo qual passa a mulher indiana no cinema (na vida, talvez?). É a mulher injustiçada, que sofre calada, que aceita sua punição, que suporta tudo. O que gosto nos filmes que focam este tipo de mulher é mostrarem que mesmo calada, consegue se fazer ouvir por outros meios. Kalyani não precisava gritar, nós víamos seu olhar. Às vezes, no meio de uma multidão ensandecida, quem chama mais a atenção é aquele que está quieto. E assim foi com ela até na cadeia, onde várias detentas a perturbavam. Dentre todas elas, Devendra viu aquela que parecia ser diferente. Acredito que este filme tenha feito muita gente olhar para as mulheres de outro modo.


OLHA PRA CIMA, NUTAN!
Bikas Ghosh (Ashok Kumar) é um detento que luta pela liberdade de seu país, e a figura central no passado de Kalyani (a partir da separação deles, a vida dela entra em declínio). O filme fala muito sobre o tema da independência, e volta e meia surgia alguma frase sobre como os revolucionários eram corajosos. Ele e Kalyani se apaixonam um pelo outro lentamente, já que era permitido sair por algumas horas no regime de prisão de Bikas, e ele as passava conversando com Kalyani e o pai dela (Raja Paranjpe). Eu estava achando o Ashok até legal, o que é um progresso enorme se formos pensar na minha recentemente adquirida aversão por ele (obrigada, Mahal!). Não vou dar spoilers, mas meu problema com ele anda sendo ele sempre aparecer para destruir a vida das heroínas que eu gosto. Mas, sejamos justos: a atuação dele foi boa no filme. Realmente acreditei que estava apaixonado. Aliás, também acreditei no amor do Devendra, mas o Dharmendra apareceu tão pouquinho (uma pena)! Se pensarmos no tempo em que a Nutan estava na tela, todo o resto apareceu pouco. Voltando ao Bikas, foi interessante terem mostrado que o amor à sua nação é tão intenso quanto qualquer outra forma de amor. 

Teve uma coisa que me incomodou num nível altíssimo...o tal assassinato que a Kalyani cometeu. Dadas as circunstâncias, ela estava errada. E isto me incomodou tanto que falei "VOCÊ ESTÁ ERRADA!" para a tela (eu interajo muito com os filmes). Depois vieram todos falando sobre como ela era um anjo e eu não conseguia aceitar isto. Porque ela errou, errou, errou, errou. Errou feio! Pronto, fim do desabafo. Todos erram, mas talvez ela não tenha sido suficientemente punida pelo que fez. Se cada um se deixar levar pelas emoções como quiser, não poderemos mais viver em sociedade. Pelo menos a Kalyani era muito consciente de tudo o que fez, o que me satisfez.  Além de consciente, ela também tomava as próprias decisões. É difícil assumir que uma pessoa tomou as próprias decisões quando ela faz tudo o que você não queria que ela fizesse, mas assim o foi. *spoiler* Quando saiu de casa, quando foi trabalhar como criada e quando cometeu o assassinato, Kalyani fez o que queria. É claro que as circunstâncias a foram levando mais ou menos para tudo aquilo, mas ela poderia ter feito tudo diferente e não quis. E aproveitando o clima de spoiler, gostei muito da atriz que fez a mulher histérica. Eu queria tacar uma cadeira nela.*fim do spoiler*

Já disse que o filme é da Nutan? Não sei muito o que escrever sobre a Nutan, porque a mistura de segurança e leveza que ela me transmite é algo complicado de explicar em palavras. Uma vez eu disse que uma amiga minha parecia aquele ventinho que bate no fim de tarde. Um dia desses eu estava observando as folhas das árvores se movendo por causa desse mesmo vento, e pensei na Nutan enquanto olhava pela janela. Estou certa de que isto vem de algum clipe de Sujata, mas depois verei isto. O que quero dizer é que não entendo como ela conseguia carregar filmes inteiros onde as personagens principais eram tão doces e simples, filmes que não precisariam se esforçar muito para serem insuportáveis . Estou seriamente encantada por ela.


As letras da trilha de Bandini são lindas, de autoria de Shailendra. A trilha é de S.D. Burman (estou cansada de elogiá-lo). Como aconteceu com a trlha de Kala Bazaar, volto a me sentir mal por falar de uma ou duas músicas quando tudo é tão belo. Uma música que me emocionou muito foi Mat Ro Mata, cuja letra falava sobre liberdade (eu disse que a voz do Manna Dey me deixava triste). "Mãe, eu nascerei outra vez no dia em que o Ganges fluir livremente" foi uma frase tããão bonita! Também gostei de O Jaanewale Ho Sake To Laut Ke Aana, na voz de Mukesh. Olha, vou ser sincera: estou lembrando de músicas meio por cima e comentando...tudo é muito bonito.

The Dark Side Of Nutan
Bandini é belo, é sensível, é forte, me deixou feliz, me deixou triste, me fez sentir amor, me fez sentir ódio. O final dá material para muita reflexão, e você pensa sobre o que é estar preso, em vários sentidos. Preso  à regras sociais, a princípios, a um amor, às regras do seu coração, à uma família, à uma nação...cada personagem estava um pouco aprisionado a algo. Sou muito apegada a personagens, tanto que só falo deles nos meus textos. Um filme pode ter um roteiro lindo e maravilhoso, que não causará o menor efeito sobre mim caso não haja um personagem que me deixe pensando sobre a vida. Pelo que me parece, a Kalyani me deixou com material para reflexão para uma semana, pelo menos. E é este tipo de coisa que não me deixa desistir do cinema.

Até uma próxima! ;)

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